quinta-feira, 31 de março de 2011

Esperança no crescimento

Quando o leitor acabar de ler esta edição do i, a dívida portuguesa terá engordado pelo menos 2 milhões de euros - é esta a proporção de crescimento da nossa dívida a cada hora que passa.

Este número deveria ter sido suficiente para, há muito tempo, José Sócrates ter accionado os alarmes de incêndio no Terreiro do Paço. Agora é tarde. A casa arde. E continuamos a deitar gasolina para a fogueira, emitindo dívida que, por sua vez, só paga dívida. Um ciclo sem fim à vista. E porquê? Porque temos vivido obcecados com os números do défice. Ao mesmo tempo, ignoramos olimpicamente os dois maiores problemas da economia portuguesa: a receita para o pagamento da dívida e a fórmula para o crescimento.

Gravemos na nossa memória colectiva o que nos trouxe até aqui para não voltarmos a repetir os mesmos erros. Mas passemos isso. Passemos para a discussão das alternativas que podem verdadeiramente mobilizar os portugueses. Com medidas, metas e objectivos concretos. É isso que nos últimos meses temos vindo a fazer.

Pagar o que devemos. Estado, empresas e particulares. Ninguém é inocente: o país está sentado em cima de uma enorme pilha de dívida ao estrangeiro. A solução passa por cada um de nós, moderando os padrões de consumo, e pelo Estado em particular. Provavelmente teremos de alienar activos. Mas o maior desafio que se coloca ao próximo governo radica na apresentação de um programa detalhado de eliminação das gorduras do Estado. E que o bisturi não tenha parcimónia quando tocar nas empresas públicas, institutos e demais, todos responsáveis pelo consumo de recursos de forma inútil. Medidas como estas promovem a recuperação económica, mesmo no curto prazo, ao contrário daquilo que aconteceria se não fossem tomadas. Idealmente, chegaremos a um ponto em que, com a cura de emagrecimento feita, já não teremos gordura para eliminar, embora continuemos a sentir a pressão para reduzir a estrutura de custos. Nesse momento, a maior fatia da nossa poupança estará assente na inovação.

A inovação e a criatividade são dois dos mais potentes motores de crescimento. Mas há mais. Centro-me apenas em dois factores historicamente relevantes, mas esquecidos: território e pessoas.

Crescer, crescer, crescer. É esta a prioridade do próximo governo. Porque só a crescer poderemos gerar empregos, criar riqueza, salvaguardar os mais desfavorecidos e pagar dívidas. Nos próximo anos, Portugal pode crescer do ponto de vista físico. As pretensões portuguesas de extensão da plataforma marítima continental continuam a ser analisadas pelas Nações Unidas e, sendo aceites, colocarão Portugal numa esquina histórica. A forma como a dobrarmos será decisiva para o nosso futuro colectivo. E não me refiro apenas às inesgotáveis cadeias de valor criadas pelo hipercluster do mar. Falo de renovação de identidade atlântica; falo de peso político e geoestratégico no mundo.

Por outro lado, temos um mercado curto, com uma população activa curta e uma pirâmide demográfica insustentável. Precisamos, por isso, de captar e fixar pessoas através das políticas certas. Precisamos de pessoas que tragam talento, criem valor e alarguem o mercado. Que contribuam para um país mais enérgico e justo. Por tudo isto, acredito que há espaço para a esperança.


por Carlos Carreiras,
Presidente do Instituto Francisco Sá Carneiro
Publicado no "i" em 30 de Março de 2011

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