quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

"Por amor aos animais"

Cresce a tendência a sua humanização

"ROMA, terça-feira, 23 de fevereiro de 2010 (ZENIT.org).– No período que precede o dia de São Valentino, foi divulgada uma pesquisa surpreendente, segundo a qual um quinto dos adultos entrevistados afirmava preferir comemorar a data ao lado de seu animal de estimação ao invés de comemorá-la com seu parceiro.

"Participaram da pesquisa 24.000 pessoas de 23 países, conforme referiu a Reuters em 8 de fevereiro. O estudo evidenciou diferenças mais pronunciadas entre as diferentes faixas etárias do que entre diferentes nacionalidades ou gêneros. Cerca de 25% dos entrevistados com menos de 35 anos afirmaram preferir seu animalzinho a seu par. Entre os adultos na faixa de 35 a 54 anos, apenas 18% sustentaram esta posição; 14% dos entrevistados com mais de 55 anos responderam da mesma forma.
Aqueles que disseram preferir um animal de estimação a uma pessoa pertenciam, de maneira geral, à categoria de menor renda.


"Os resultados da pesquisa confirmam a crescente tendência à humanização dos animais. Em 23 de janeiro, um artigo do jornal britânico Telegraph tratava da retomada de uma antiga prática pagã - de sepultar pessoas junto aos seu animais de estimação. De acordo com o jornal, foi aprovado, em Lincolnshire, o último de uma série de cemitérios unificados para animais e seres humanos.

"O artigo cita Penny Lally, administrador do “Woodland Burial Place” em Penwith. Lally declamo ao Telegraph ter sepultado mais de 30 pessoas juntamente aos seus animais de estimação, e que outros 120 sepultamentos já estariam agendados.

“Para muitas pessoas, o luto por seu animal de estimação não difere daquele vivenciado com a perda de um familiar, especialmente se considerarmos que os animais proporcionam uma vida mais estruturada para muitas pessoas que vivem sós”, observou Elaine Pendlebury, veterinária que atua na instituição de caridade PDSA.

"A ideia de cemitérios conjuntos deriva do uso já difundido de cemitérios destinados a animais. Em 26 de outubro do ano passado, o Chicago Tribune pubicou um artigo no qual comentava que um dos cemitérios para animais mais antigo dos EUA, o Hindsdale Animal Cemetery, de Willowbrook, no Illinois, já contava com mais de 15.000 animais sepultados.

Como familiares

Segundo Micheal Schaffer, autor do livro “One Nation Under Dog”, as inscrições nas lápides têm mudado ao longo do tempo, refletindo a elevação, concedida aos animais, à condição de “plenos membros da família”.

“Ao se visitar os antigos cemitérios para animais, as inscrições que se encontram dirão coisas como ‘Aqui jaz Fido, servo fiel’, ou ainda ‘Aqui jaz Fido, o melhor amigo do homem’”, diz Schaffer. “Hoje, ao contrário, se lê: ‘Minha pequena menina’, ou “Sentimos sua falta, Mamãe e Papai’. As pessoas desenvolveram uma concepção a respeito dos próprios animais como se estes fossem seus filhos – um desenvolvimento um tanto dramático”.

"Não se trata apenas de sentimentos. As pessoas estão dispostas a gastar somas cada vez maiores de dinheiro com os próprios animais. O artigo do Chicago Tribune conta o caso de um homem que gastou mais de 2.000 dólares no funeral de seu cachorro, após ter gasto mais de 7.000 dólares em tratamentos médicos na esperança de salvar sua vida.

"De fato, as despesas com animais têm aumentado notavelmente nos últimos anos. Em 8 de fevereiro deste ano, o American Pet Products Manufacturers Association (APPA) divulgou seu último relatório anual, citando que as despesas com animais domésticos nos EUA aumentaram 5,4% no último ano, passando de 43,2 bilhões de dólares ao ano para mais de 45,5 bilhões de dólares em 2009. A indústria prevê que estas despesas ultrapassem os 47 bilhões de dólares em 2010.

"A maior parte desta tendência deve-se ao aumento com despesas médico-veterinárias, que registraram um incremento de 8,5% ao longo do último ano. O relatório observa que os serviços médicos aplicados a animais domésticos incluem hoje tomografias computadorizadas, tratamentos de canal, remoção de tumores e antidepressivos.

"O presidente da APPA, Bob Vetere, observou que com esta tendência de humanização dos animais, os padrões de qualidade de vida de homens e animais estão cada vez mais próximos, não apenas no campo da saúde, mas também da alimentação e do vestuário.

(...)

“A humanização dos animais é o principal factor responsável pelo crescimento do mercado de acessórios para animais de ‘pets’, afirma o comunicado do Global Industry Analysts. “Os donos veem seus animais como seus mais fiéis companheiros, e demonstram a intenção de lhes dar tanto afeto quanto aos seus cônjuges e filhos”, acrescenta.

Pessoas?

Margaret Somerville, diretora do Center for Medicine, Ethics and Law da McGill University, no Canadá, abordou a questão da humanização dos animais domésticos em um artigo publicado na internet em 27 de janeiro.

"Ela observa que alguns especialistas em ética defendem conferir aos animais o status de pessoa. Isto, entretanto, não seria desejável, uma vez que significaria abolir a ideia de que os seres humanos teriam algum valor especial, representando uma ameaça a seus direitos fundamentais.

“Em outras palava, se os animais se tornassem pessoas, as pessoas se tornariam animais”, observou Somerville - devemos, ao contrário, sustentar que a condição de pessoa é exclusiva dos seres humanos.

Esquecer Deus

"A aparente contradição, evidenciada por Somerville, entre a perda do respeito pela vida humana e elevação dos animais a uma condição quase humana, apresenta um aspecto teológico de fundo.

"Bento XVI fez uma breve referência ao tema numa audiência geral em 11 de janeiro de 2006. O contexto era o de um comentário ao Salmo 144.

"No texto, lê-se: “Senhor, o que é o homem para que se manifeste a ele?... Grande felicidade para o homem, conhecer o próprio Criador. Nisto nos diferenciamos das feras e outros animais, porque sabemos que temos um Criador, enquanto eles não sabem”.

"O Papa em seguida retomou um comentário sobre o Salmo feito por um dos Padres da Igreja, Orígenes: “Vale a pena medita sobre estas palavras de Orígenes, que vê a diferença fundamental entre o homem e os animais no fato de que o homem é capaz de conhecer a Deus, seu Criador, de que o homem é capaz da verdade, capaz de um conhecimento que se converte em amizade”, disse o Papa.

“É importante, em nosso tempo, que não nos esqueçamos de Deus, juntamente com todos os demais saberes que conquistamos, e que são tantos!”, observou. “Estes podem se tornar até perigosos, se nos falta o conhecimeto fundamental que confere significado e orientação a tudo: o conhecimento do Deus Criador”, concluiu.

"Efectivamente, uma das tendências de nossa sociedade moderna é a de, tendo perdido Deus de vista, desenvolver uma mentalidade que também perde de vista a dignidade da pessoa humana. Assim, há uma conexão entre a falta de respeito pela vida humana, cada vez mais considerada sob uma perspectiva utilitarista, e a humanização dos animais. Um passo a mais em direção ao retorno à cultura pagã."

Por padre John Flynn, LC

3 comentários:

Rui Moreira disse...

Acho muito bem que as pessoas gostem dos animais e aprendam a tratar os animais - todos os animais - com a dignidade que a nossa condição de seres humanos impõe que se dispense a todas as coisas da netureza.

dito isto, também já tenho assistido a esses sintomas de uma estranha forma de "humanização" dos animais,q ue me preocupam, porque não representam apenas um upgrade na condição animal mas, sobretudo e na parte que me preocupa, um downgrade da condição humana. E não vejo aí apenas sintomas de um retorno a uma cultura pagã, embora me preocupe a fragilidade a que estão sujeitos alguns valores da mundividência cristã - mas sobretudo uma ausência de fundações humanas, numa sociedade cada mais mais materialista e "isolacionista".

Em suma, o que me preocupa é verificar que os laços entre humanos nesta sociedade louca não são, para muitos, suficientemente forte para vincar a diferença que nos separa dos animais. E isso é um passo como outro qualquer - mas mais grave - para a decadência de uma sociedade, ainda que, por vezes, dele emanem manifestações "benignas".

Paulo Novais disse...

Bem Rui, assim para inicio de conversa acho que tens razão no que dizes. Eu tenho animais que adoro e a quem não falto com nada do que um animal precisa.
Talvez mais um bocadinho do que isso, vá lá.
Mas também te digo, que quanto mais conheço a natureza humana, mais gosto dos animais. Claro que aqui não podemos generalizar.
A partir do momento que assumi ser "dono" de um ou mais animal, assumi também o compromisso de que o animal teria uma vida digna. E assim faço. Claro que hoje em dia, tratar de um animal sai caro. São registos, vacinas, desparatização, ração, controle veterinário, entre muitas outras. E quando eles adoecem, então, vá lá, até a barraca abana.
Mas e então. Ou assumimos o animal ou então ficamos quietos. E não o podemos fazer só quando as coisas correm bem ou mais ou menos.

Depois temos a componente da relação entre nós e os animais. Eu tenho um cão e um gato. O gato, como e óbvio, na sua condição de felino que sai de casa quando quer, só quer cama, comida e roupa lavada. Fora isso, apenas gosta da minha filha mais nova.
Com o cão, a coisa muda de figura. A sua lealdade e companheirismo são a toda a prova. É por isso fácil a relação dos membros da família com ele, pareça às vezes, a relação que se pode ter com uma criança. Em termos básicos e gerais, como é óbvio.
E depois tem outra grande vantagem. Não fala... hehehe :D

Paulo Novais disse...

Falando de coisas sérias. Infelizmente a sociedade cresce numa direcção que pouco ou nada tem a ver com as relações humanas. As pessoas trabalham muito, muitas vezes em mais do que um emprego, as deslocações cada vez são mais morosas, o cansaço impera.
Em casa, para além da reunião da família à mesa para a refeição, a correr muito bem, pois a maioria das vezes cada um come quando pode, as pessoas refugiam-se na televisão, computador, telefone, leitura e muitas vezes mais trabalho.
Por consequência, muitas pessoas à medida que envelhecem e a família sai de casa ou, pelo menos a frequenta menos, substituem a companhia por um animal. Até porque a partir de uma determinada idade, pouco mais se pode fazer. A adopção deixa de ser opção, se alguma vez chegou a ser.
Eu sou sincero. Hoje se pudesse adoptar uma criança, sem interessar a raça (aí vêm eles outra vez) não hesitava em fazê-lo.
Se alguma vez tive condições óptimas para criar uma criança, é agora. Por força das circunstâncias e porque a vida estabiliza a partir de uma fase da vida. Mas está, infelizmente fora de questão. Outras pessoas terão, porventura, outras razões.
Para além de que a idade é desde logo um obstáculo.
Tentamos então, dividir a nossa disponibilidade por várias iniciativas, de cariz mais ou menos humanitário, ambiental, social e outras.
E arranjamos um cão.
;)