quinta-feira, 26 de novembro de 2009

"Políticas da e(i)migração"

"A criação de políticas coerentes para a emigração daria maior consequência àquilo que parte da sociedade já faz, sem nenhum incentivo estatal.

"As políticas públicas em relação à emigração e à imigração são um dos aspectos mais negligenciados da governação em Portugal. No entanto, para um país integrado na União Europeia, sem moeda própria e com uma economia aberta, as políticas neste domínio são fulcrais. Delas depende, em parte, a nossa prosperidade presente e a capacidade para sustentar o Estado social no futuro.

"Pensemos, em primeiro lugar, na emigração. É sabido que, face ao fraco potencial de crescimento da economia portuguesa, as taxas altas de desemprego vieram para ficar. Uma forma eficaz de as reduzir - e de aumentar as remessas do exterior - passa pelo incentivo à emigração. Já sei que alguns vão dizer que isso é inaceitável e que "é uma vergonha que o país obrigue os seus filhos a procurar emprego lá fora". Mas este discurso de virgens ofendidas é irrelevante. O que importa é pensar nas possibilidades que temos no lugar em que estamos. Por um lado, a intervenção do Estado na facilitação de fluxos migratórios para países da União Europeia deveria ser considerada mais uma medida de migração interna, para uma área económica comum, do que propriamente de emigração clássica. Por outro lado, a organização desses fluxos migratórios para outros países que nos são próximos, como Angola e Brasil, teria a vantagem de lidar com áreas geográficas aparentemente pouco afectadas pela crise económica internacional.

"A criação de políticas coerentes para a emigração daria maior consequência àquilo que uma boa parte da sociedade já faz, sem nenhum incentivo estatal. Os dados disponíveis mostram que Portugal nunca deixou de ser um país de emigrantes e que a emigração recrudesceu recentemente, quando o desemprego começou a aumentar. Os portugueses continuam a encontrar trabalho até nos países mais afectados pela falta de emprego, como Espanha, uma vez que estão dispostos a fazer aí aquilo que não querem fazer em Portugal (entre outras coisas, porque os salários são melhores).

"As políticas em relação à imigração são igualmente essenciais. Se, mesmo numa situação de desemprego alto, Portugal tem um défice de qualificações em vários domínios, justifica-se o incentivo à imigração selectiva. Muitos Estados fazem-no, mesmo com medidas simples como a publicação de ofertas de emprego em jornais de países estrangeiros cuja mão-de-obra se pretende captar.

"Porém, o incentivo à imigração poderá tornar-se ainda mais importante se o clima económico melhorar. Os imigrantes são, em geral, mais jovens e saudáveis que a maioria da população. A sua predisposição para trabalhar mais e melhor do que a dos autóctones, a sua adaptabilidade às exigências do mercado de trabalho ajuda a torná--los casos de sucesso. Os imigrantes não pedem apoios estatais - preferem oportunidades de trabalho. Num quadro de crescimento negativo da população activa e da própria natalidade, só o trabalho dos imigrantes poderá garantir a sustentabilidade futura do estado social."

por João Cardoso Rosas,Professor universitário de Teoria Política publicado no "i" em 26 de Novembro de 2009

Sem comentários: