sábado, 10 de outubro de 2009

Saint-Exupéry

"Conheço gente que demanda o mar ao passo lento das caravanas e que tem necessidade do mar. Ao chegarem ao promontório, vêem-se senhores dessa extensão cheia de silêncio e de densidade,que furta aos olhares deles as provisões de algas e de corais, e respiram a acidez do sal e ali ficam eles, maravilhados diante de um espectáculo que de momento não lhes serve de nada, porque uma pessoa não pode apoderar-se do mar. Mas ficam com os corações lavados da escravidão das coisas mesquinhas. Talvez observassem descoroçoados, como que através das grades duma prisão, a cafeteira, os utensílios domésticos, as queixas das mulheres, a ganga quotidiana, que pode ser rosto lido à transparência e sentido das coisas, mas pode por vezes converter-se em túmulo e engrossar e aprisionar.

"Abastecem-se então de extensão e voltam para casa com a felicidade lá encontrada. E a casa transforma-se, por existir lá longe a planície do nascer-do-sol e o mar. Porque tudo dá para alguma coisa mais vasta do que a gente. Tudo se torna caminho, estrada e janela que dá para coisa diferente de nós."

in Cidadela, XVIII

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